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RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO NOTARIAL E REGISTRAL
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Desde os primeiros momentos da vida de uma pessoa até o último, está-se em constante contato com a atividade notarial e registral exercida pelos cartórios, seja na celebração de contratos, aquisição de bens, no casamento, testamentos, inventários, etc.

Dessa forma, dada a importância dessa atividade para a sociedade, a Constituição Federal de 88 tratou de cuidar de seu exercício, de modo que só exercem serviços registrais e notariais pessoas capacitadas, por meio de concurso público, e com a delegação do Poder Público[1].

Em consonância com a Constituição Federal, a Lei dos Cartórios (n.º 8.935, de novembro de 1994), que dispõe sobre serviços notariais e de registros, deixa evidente a importância da atividade cartorária para sociedade como um todo e revela o manifesto interesse do Poder Público no ofício, visto que se trata de uma atividade destinada a garantir publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, uma vez que os notários, tabeliães e oficiais de registros são profissionais dotados de fé pública, cuja atividade é delegada pelo próprio Poder Público.

Nesse sentido, é evidente que os cartórios devem agir à luz dos princípios constitucionais da publicidade, autenticidade, segurança e eficácia, conforme discrimina o artigo 37, caput da Constituição Federal[2]. Entretanto, por razões óbvias, os cartórios não estão isentos de cometerem atos capazes de causar prejuízos a terceiros, sobretudo quando há inobservância dos princípios pelos quais são regidos, ou não cumprem com sua finalidade legal.

Nesse sentido, a Lei dos Cartórios e a Lei dos Registros Públicos (Lei n.º 6.015, de 1973) trataram de prever a responsabilidade civil dos notários e oficiais perante terceiros:

Art. 22 da Lei dos Cartórios.  Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso.

Art.. 28 da Lei dos Registros Públicos. Além dos casos expressamente consignados, os oficiais são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que, pessoalmente, ou pelos prepostos ou substitutos que indicarem, causarem, por culpa ou dolo, aos interessados no registro.

Da leitura dos artigos, extrai-se que se trata de responsabilidade subjetiva, ou seja, prescinde de comprovação de dolo (ação ou omissão a fim de causar dano) ou culpa (imperícia, imprudência ou negligência). Na mesma linha, tem-se o julgado do Supremo Tribunal Federal, de relatoria do Ministro Luiz Fux, no julgamento do RE n.º 842.846/SC:

“Destaco ainda, por oportuno, que a Lei 8.935/94, que regulamenta o art. 236 da Constituição Federal e fixa o estatuto dos serviços notariais e de registro, predica no seu art. 22 que “os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso. (Redação dada pela Lei nº 13.286, de 2016)”, o que configura inequívoca responsabilidade civil subjetiva dos notários e oficiais de registro, que deverão responder regressivamente perante o Estado, por dolo ou culpa, nas hipóteses de dano causado a terceiros no exercício de suas funções (sem destaque no original).”[3]

Em outro prisma, de acordo com o entendimento extraído do mesmo julgamento, a responsabilidade do Estado pelos prejuízos causados pelos cartórios a terceiros é objetiva, de modo que, caso haja a comprovação do dano e do nexo causal entre a ação ou omissão dos cartórios, o Estado responde independentemente de sua culpa ou dolo.

“O Estado responde objetivamente pelos atos dos tabeliães registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem danos a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa, sob pena de responsabilidade administrativa.[4]

Entretanto, nos termos da lei, o Estado poderá exercer direito de regresso em face do oficial ou notário causador do dano, mas para que seja devida a reparação do prejuízo ao Estado, necessariamente, precisa ficar demonstrado o dolo ou culpa do cartório, assim prevê a Constituição Federal.

“Artigo 37, § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

Por fim, destaca-se, ainda que os oficiais de registros e notários são responsáveis pelos atos praticados por quaisquer de seus prepostos na serventia, alinhando-se a regra disposta no Código Civil de 2022, art. 932, III.

Ante ao exposto, os cartórios exercem uma atividade delegada pelo Poder Público e, ainda que sejam dotados de fé pública, estão sujeitos à causarem prejuízos à terceiros quando descumprem sua finalidade de garantira publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos, bem como agem com inobservância à princípios constitucionais e, uma vez causado o dano, o Estado pode ser demandado e responsabilizado a reparar com base no entendimento do STF, e caso reste comprovada a culpa ou dolo do agente causador do prejuízo, o Estado pode demandar o cartório em uma ação regressiva.

[1] Brasil. Constituição Federal de 1988: Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.

[2] BRASIL. Constituição Federal de 1988: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[3] Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n.º 842846 Santa Catarina. Recorrente: Estado de Santa Catarina. Recorrido: Sebastião Vargas. Relator Ministro Luiz Fux.

[4] https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=750504507

*Formado em Direito pela UEM (2023). Advogado. E-mail: gabriel.cuenca@fmadvoc.com.br.

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