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CONTROVÉRSIA ACERCA DO PAGAMENTO DE FGTS EM ACORDOS JUDICIAIS TRABALHISTAS
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Resumo

Em decorrência das ações e dos acordos judiciais realizados em reclamações trabalhistas perante a Justiça do Trabalho que abarcavam os valores também devidos a título de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) pelo empregador, pairou a dúvida acerca da eficácia do pagamento diretamente ao empregado, ou se seria necessário o pagamento diretamente em conta vinculada do titular. No entanto, em razão das fiscalizações realizadas pelo Ministério do Trabalho, estes não possuíam acesso aos acordos realizados judicialmente, não tendo assim, conhecimento do FGTS mensal e rescisório que já estaria sendo pago pelos empregadores, instaurando autos de infrações para que as empresas pudessem realizar o pagamento do FGTS administrativamente sob pena de aplicação de multa. Destaca-se que a Lei 8.036 de 11 de maio de 1990 destacava o ensinamento de que obrigação de recolher o FGTS é cumprida por meio de depósito em conta vinculada e não direto ao trabalhador. Em  dezembro de 2019 foi promulgada a Lei 13.932, trazendo alterações sobre o recolhimento do FGTS. Contudo, ainda há divergência entre os Tribunais Regionais do Trabalho validando a quitação do pagamento do FGTS feito diretamente ao empregado. Diante do efeito gerado pela ampla discussão da matéria, o STJ, em recurso repetitivo (Tema 1.176), determinou a suspensão dos julgamentos de todos os processos, para definir a eficácia do pagamento direto ao empregado ou para que sejam realizados por meio de depósitos em contas vinculadas do titular.

Palavras-chave: FGTS; pagamento de FGTS em acordo; pagamento em duplicidade; Lei 8.036/1990; Lei 13.982/2019; Tema 1.176/STJ.

De acordo com o artigo 15º da Lei nº 8.036/1990, os empregadores são obrigados a depositar em conta vinculada, até o vigésimo dia de cada mês, 8% (oito por cento) da remuneração do empregado, vejamos:

Art. 15. Para os fins previstos nesta Lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o vigésimo dia de cada mês, em conta vinculada, a importância correspondente a 8% (oito por cento) da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e a Gratificação de Natal de que trata a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962.

Do mesmo modo, o empregador é obrigado a realizar o pagamento os valores relativos à rescisão do contrato de trabalho, vejamos o artigo 18º do mesmo dispositivo legal:

Art. 18. Ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte do empregador, ficará este obrigado a depositar na conta vinculada do trabalhador no FGTS os valores relativos aos depósitos referentes ao mês da rescisão e ao imediatamente anterior, que ainda não houver sido recolhido, sem prejuízo das cominações legais.

Destaca-se que, em 11 de dezembro de 2019, foi promulgada a Lei 13.932, trazendo alterações nas regras relativas ao pagamento do FGTS, sendo acrescido no texto legal o artigo 26-A, com a seguinte redação:

Art. 26-A. Para fins de apuração e lançamento, considera-se não quitado o valor relativo ao FGTS pago diretamente ao trabalhador, vedada a sua conversão em indenização compensatória.

Vê-se, assim, que o pagamento diretamente ao trabalhador nunca foi autorizado pela Lei nº 8.036/90, uma vez que, o legislador elegeu o depósito na conta fundiária do trabalhador como meio de quitação do FGTS.

No entanto, é comum, em transação judicial trabalhista as partes ajustarem o pagamento devido a título de FGTS diretamente ao empregado. Essa prática conta, inclusive, com a homologação do juízo trabalhista que oferece ao empregador plena e total quitação das verbas objeto da transação.

No entanto, o Ministério do Trabalho passou a notificar as empresas após a fiscalização e análise, por exemplo, de extratos de FGTS no sistema FGC da CAIXA, dados remuneratórios e de vínculos da RAIS, CNIS e E-social, instaurando autos de infrações para que as empresas pudessem realizar o pagamento de FGTS mensal e rescisório em determinado prazo, sob pena de multa administrativa, uma vez que a não possuíam acesso e não tinham conhecimento dos acordos realizados judicialmente.

Do mesmo modo, empregadores cobrados pela União Federal asseguravam na Justiça do Trabalho o direito de não pagar o FGTS que foi diretamente pago aos trabalhadores por força de ajustes firmados em ações trabalhistas.

Assim, os valores relativos ao FGTS pagos diretamente pelo empregador ao trabalhador eram considerados legítimos e definitivos.

Contudo, ainda não há um entendimento pacificado sobre o tema, sendo que, a título de exemplo citamos trecho do acórdão proferido em sede de Recurso de Revista (TST) nos autos da reclamatória trabalhista nº 1000022-39.2019.5.02.0052, proferida em 11.11.2021, ensinando que os depósitos de FGTS devem ser depositados em conta vinculada para sua quitação:

O agravo de instrumento deve ser provido, por possível violação dos artigos 15 e 18 da Lei n. 8036/1990, dado que a obrigação de recolher o FGTS não é cumprida enquanto não se a realiza por meio de depósito em conta vinculada, que permite inclusive a utilização desses aportes para fim social que transcende o interesse individual do trabalhador.

Neste mesmo sentido, há decisões que entendem que mesmo que pagas diretamente, os empregados receberam as verbas fundiárias, sendo válida a conciliação realizada pelo magistrado, vejamos por exemplo o Agravo de Instrumento em Recurso de Revista de nº 10051-15.2018.5.03.0169, publicado em 25/02/2022:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEI Nº 13.015/2014. FGTS. PAGAMENTO FEITO DIRETAMENTE AO EMPREGADO. ACORDO JUDICIAL. SÚMULA 259 DO TST. Depreende-se dos autos que o recolhimento fundiário foi objeto de acordo judicial firmado entre a reclamante e a ex-empregadora, ocasião na qual se autorizou o pagamento direto das verbas relativas a depósitos do FGTS e indenização de 40% sobre o saldo do FGTS. A controvérsia se instala em razão da previsão do art. 18, caput e §1°, da Lei 8.036/90, que determina que a importância referente a depósitos fundiários e indenização de 40%, em caso de despedida sem justa causa, deve ser depositada na conta vinculada do trabalhador. No entanto, no caso em tela, é forçoso reconhecer a autoridade da qual se reveste o acordo judicial homologado pelo Poder Judiciário. O magistrado, ao homologar o acordo apresentado, reconheceu a legalidade do instrumento por meio da ponderação de interesses, buscando assegurar a observância das normas garantidoras dos direitos sociais dos trabalhadores. Assim, considerando que os empregados receberam as verbas fundiárias adequadamente, e que o pagamento se realizou sob guarida jurisdicional, não há que se falar em invalidação da conciliação operada, sob pena de infringência do quanto previsto nos arts. 487, “b”, do NCPC; 831, parágrafo único, da CLT e Súmula 259 do TST. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

Em razão das diversas discussões acerca do tema, instaurou-se a instabilidade dos acordos realizados judicialmente, trazendo insegurança para o empregador celebrar um acordo contendo a verba do FGTS e ser cobrado ao pagamento dúplice da verba.

A questão submetida a julgamento, cadastrada como Tema 1.176 na base de dados do STJ, foi redigida da seguinte forma: “Definir se são eficazes os pagamentos de FGTS realizados na vigência da redação dada ao artigo 18 da Lei 8.036/1990 pela Lei 9.491/1997, diretamente ao empregado, em decorrência de acordo celebrado na Justiça do Trabalho, ao invés de efetivados por meio de depósitos nas contas vinculadas do titular“.

O colegiado determinou a suspensão do julgamento de todos os recursos especiais e agravos em recursos especiais que envolvam a matéria em primeira e segunda instâncias, e também no STJ, como previsto no artigo 1.037, inciso II, do Código de Processo Civil.[1]

Conclui-se assim que, para evitar que ocorra o pagamento em dobro do FGTS mensal e rescisório decorrente de acordos judiciais, é recomendado que as empresas realizem o pagamento da parcela em conta vinculada do empregado, sendo pertinente realizar a ressalva em audiência, uma vez que o tema ainda é controverso.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei 5.452 de 1 de maio de 1943. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em: 03 de jan. de 2023.

BRASIL. Lei 8.036 de 11 de maio de 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8036consol.htm. Acesso em: 03 de jan. de 2023.

TST. Processo: AIRR – 10051-15.2018.5.03.0169, Órgão Judicante: 2ª Turma, Relatora: Maria Helena Mallmann, Julgamento: 23/02/2022, Publicação: 25/02/2022.

STJ. ProAfR no RECURSO ESPECIAL Nº 2.003.509 – RN (2022/0146350-9), Relatora: Ministra Assusete Magalhães, Julgamento: 22/11/2022, Publicação: 09/12/2022.

BRASIL. Lei 13.105 de 16 de março de 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 03 de jan. de 2023.

[1] Art. 1.037. Selecionados os recursos, o relator, no tribunal superior, constatando a presença do pressuposto do caput do art. 1.036 , proferirá decisão de afetação, na qual:

II – determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional;

*** Juliana Beatriz Silva Manin – Formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – Câmpus Maringá (2018). Especialista em Direito e Processo do Trabalho. Advogada na área trabalhista. E-mail: juliana.manin@fmadvoc.com.br.

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